A PANDEMIA E O PACTO DE TODOS CONTRA A EDUCAÇÃO
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Pontos abordados: Apagão de dados da educação. A quem interessa os microdados da educação? Enem por escola. Direita e esquerda unidas. A quem toca cobrar esses dados da educação? Escolas e Universidades permaneceram fechadas. O faz-de-conta do ensina/aprende. As escolas que buscam bons resultados dos seus alunos saíram-se melhor. O CNE e o ensino remoto ainda em 2022. Escolas negam ensino domiciliar aos alunos em plena pandemia. A legislação garante atendimento aos alunos afastados por motivo de saúde. Aulas gravadas, um direito do aluno, sempre, não somente na pandemia.Os últimos dados sobre os resultados da educação foi de 2019
e já não constam mais do site do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira - INEP/MEC, desde o último dia 18 de fevereiro. O
governo federal alega que a razão disso foi a LGPD (Lei Geral de Proteção de
Dados), mas infelizmente isso parece ser uma desculpa que não se sustenta em
pé. Além disso, os dados relativos aos microdados lançados de 2020 estão
incompletos, conforme se pode observar na matéria sobre o tema.
Ora, se há mesmo a intenção de obedecer à LGPD, que seja
acionada a justiça para dirimir essa questão que, ao nosso ver, causa estranheza,
pois os dados pessoais dos alunos nunca foram revelados e, se existe alguma
chance de o sistema ser violado, que se criem barreiras para tanto, mas nunca
impedir que saibamos como estão os dados da educação.
A quem interessa os microdados da educação?
Dentre esses dados sonegados aos contribuintes e pais
pagadores de impostos está o que é mais caro para nós: o ENEM por escola que dá
um retirado bem realístico da educação na série histórica, desde 2009,
escondida pelo MEC. Aliás, essa é a função primordial do INEP!
O investimento que fazemos na educação dos nossos filhos é muito alto, seja na escola pública ou na particular. Investir no escuro é a pior coisa para assegurar que nossos alunos estão aprendendo como devem e no tempo correto, por isso esses dados levantados pelo Instituto são tão importantes, quer para aprimorar as políticas públicas votadas para a educação, quer para os pais que pagam a escola dos filhos fazerem mudanças a partir das avaliações que são disponibilizadas pelo poder público.
Enem por escola
Essa informação é muito importante, talvez a mais
transparente e de fácil assimilação para pais de alunos e contribuintes.
Especialmente agora, faz-se importante saber como foi o desempenho da escola do
seu filho durante a pandemia, comparado com 2019, como e quanto nossos alunos
aprenderam nesse período. Essas respostas estão nesse apagão de dados da
educação e não serão mostradas, pelo menos antes das eleições deste ano, pois
isso talvez não interesse, neste momento, aos gestores das instituições públicas
nem aos da iniciativa privada, pois certamente é uma realidade ruim que ninguém
que expor.
Direita e esquerda unidas
Nesse quesito, pela primeira vez no Brasil, parecem que estão
unidos, de mãos dadas, contra a educação os espectros políticos da direita e da
esquerda. Somente a imprensa, até o momento, está cobrando essa transparência.
O apagão de dados parece contemplar interesses de ambos os lados, uma vez que
agora a culpa pelo fiasco do desempenho educacional dos alunos brasileiros recai
sobre ambos os lados!
A quem toca cobrar esses dados da
educação?
É notável não se observar, até o momento, que algum desses
movimentos e campanhas ditos que lutam pelo direito à educação foram ao STF
para obrigar o governo federal a abrir os dados completos do desempenho da
educação dos primeiros dois anos da pandemia de coronavírus 2020/21.
Também não vimos movimentação do MP, de entidades sindicais
de professores e muito menos de donos de escolas privadas nesse sentido. Estão todos
silentes ante essa verdadeira tragédia que se abateu sobre a educação
brasileira agravada pela pandemia. Esse silêncio e esse pacto tácito parece
interessar a todos que usufruíram do FICA EM CASA.
Por falar em STF é possível que também se cale se alguma
entidade legitimada for em busca de uma ordem à abertura ampla e irrestrita dos
microdados da educação colhidos pelo INEP/MEC, inclusive o retorno aos sites do
MEC/INEP da série histórica, o que mais nos choca.
Isso, porque o STF foi quem deu força aos governadores e
prefeitos para que esses conduzissem a pandemia ao seu bel prazer. Dessa forma,
não sabemos como o STF responderá a uma eventual provocação sobre o assunto.
Escolas e Universidades permaneceram fechadas
Verdade é que, com escolas fechadas e universidades também, até
o momento, o governo federal, notadamente enfraquecido, não conseguiu sequer
abrir as instituições de ensino sob seu comando. Já as escolas da educação
básica tocam aos municípios e aos estados e muitas ainda estão com restrições,
o que aprofunda e empurra alunos para mais um ano perdido.
O faz-de-conta do ensina/aprende
Apesar de todos os aparatos tecnológicos existentes hoje,
vimos que o despreparo dos professores, e também a falta de acesso à tecnologia
por parte dos alunos, foi um coadjuvante para que o ensino remoto não fosse
efetivo. Boa parte dos estudantes, tanto do ensino básico quanto do superior,
foi prejudicada.
Outro aspecto a ser considerado, ao menos em relação às
escolas e universidades públicas que lutaram para que seus profissionais permanecessem
em casa, em “home office”, percebeu-se
em muitos casos a falta de compromisso e empenho com seus alunos.
Já nas escolas privadas, ao menos em parte, inicialmente houve
a mesma resistência, mas o retorno ocorreu antes, pois os professores não têm a
garantia do emprego dos professores públicos, algo que é preciso urgentemente
acabar, se queremos mesmo educação de qualidade e com compromisso dos
profissionais da educação.
Verdade seja dita: testemunhamos que muitos professores se
reinventaram e usaram a tecnologia para manter seus alunos com conteúdos, mesmo
que por um bom tempo online, principalmente aqueles das escolas que melhores se
destacaram historicamente com bons resultados do ensino e aprovações nos testes
para o ingresso no ensino superior.
As escolas que buscam bons resultados
dos seus alunos saíram-se melhor
Certamente com a pandemia e o ensino remoto todas as escolas
perderam em qualidade de ensino/aprendizagem, cada um no seu nível, pois nem
todos os alunos aprendem da mesma forma.
Entretanto, se pudéssemos ter acesso às informações contidas
nos microdados, com toda certeza, iríamos ver que as melhores escolas, aquelas
que obtiveram historicamente melhores resultados, saíram-se melhor que as
outras nesse período.
Particularmente conheço escolas e alunos que que se saíram
tão bem com o ensino remoto quanto com o presencial, claro que guardando as
devidas particularidades de cada aluno. É obvio que presencialmente o rendimento
seria muito melhor.
Escolas negam ensino domiciliar aos alunos em plena pandemia
Sem dúvida nenhuma se alguma lição ficou nessa questão de
pandemia e ensino remoto é que essa não será a primeira nem a última pandemia
ou algo que venha, por algum tempo, afastar alunos do ambiente escolar e que a
tecnologia pode e deve ser usada para amenizar os impactos causados por
quaisquer tipos de afastamento forçado.
Entretanto, parece que essa lição está difícil das escolas
assimilarem. Muitas negam aos seus alunos acesso ao ensino remoto durante e
fora da pandemia.
O CNE e o ensino remoto ainda em 2022
Assim vimos o lento CNE acordando um pouco tarde no início do
ano letivo de 2022, quando a vigência de sua Recomendação quanto ao direito ao
ensino remoto havia terminado em 31 de dezembro de 2021. Somente quando algumas
escolas já haviam retomado o ensino em janeiro deste ano é que o CNE lançou Nota dizendo que o ensino remoto poderia
ser estendido em casos excepcionais enquanto durasse a pandemia.
A legislação garante atendimento aos alunos afastados por
motivo de saúde
Nada
mais cristalino, há décadas, ao menos desde 1996,
o direito dos alunos serem atendidos em suas necessidades especiais de saúde no
lar
ou no hospital. Só que agora temos o uso tão importante das tecnologias, no
entanto, ainda carece de regulamentação conforme o texto da Lei nº 13.716, de 24 de setembro de 2018:
"Art. 4º-A. É assegurado atendimento educacional,
durante o período de internação, ao aluno da educação básica internado para
tratamento de saúde em regime hospitalar ou domiciliar por tempo prolongado,
conforme dispuser o Poder Público em regulamento, na esfera de sua competência
federativa."
Aulas gravadas, um direito do aluno,
sempre, não somente na pandemia
Recentemente essa legislação foi reforçada na Lei de
Diretrizes e Base da Educação – LDB. No entanto, é preciso que o CNE e os
Conselhos de Educação estaduais e do DF contemplem de forma clara em suas
Resoluções que o uso de tecnologia deverá ser usado, orientando as escolas para
que gravem as aulas, seja agora na pandemia ou depois dessa. Isso tem que se
tornar uma prática em todas as escolas, públicas e privadas!
Certamente quando essa lei foi implementada ainda em 1996 os
alunos não tinham essa tecnologia à disposição e não havia como repor as aulas
perdidas de forma ao aluno ter igualdade de oportunidades com os alunos na sua
escola, mas agora não há mais desculpas.
Mesmo assim, muito gestores de escolas públicas e privadas e
muitas instituições de ensino obtusas e imprudentes têm sonegado aos alunos, em
meio à pandemia, acesso às aulas gravadas de suas classes, nos dias letivos em
que estiver em quarentena em virtude de ter contraído covid/gripe ou ter tido
contato próximo com alguém contaminado. A burocracia educacional ainda exige
teste para tanto!
Ora, isso é um crime! As escolas têm condições de fornecer
aos alunos esse suporte indispensável e devem ser obrigadas a fazê-lo, nem que
seja, por hora, por força de ordem judicial. Nesse quesito faz toda diferença,
na hora da escolha, daqui para frente, saber se a escola que você pretende
matricular seu filho tem esse dispositivo de cuidado com o processo de
ensino/aprendizagem.
É uma segurança a mais para evitar perdas na aprendizagem, em
caso do aluno vir a precisar faltar uma ou mais aulas! Seja em tempos de
pandemia, enfermidade ou qualquer outro impedimento de força maior! A escola
que assim agir deve ser valorizada em detrimento de outra qualquer, pois é uma
escola comprometida com o processo de ensino aprendizagem.
Concluindo, esperamos que os atores envolvidos com a
educação, desde nós, pais de alunos, sejam diligentes e esforcem-se pela
transparência e esforço para que as perdas vividas durante a pandemia sejam reparadas
ao máximo e que haja um pacto pela educação de qualidade, independentemente do
espectro político escolhido por cada um. Há como melhorar, temos instrumentos e
vivência para tanto, basta somente combatermos os corporativismos existentes no
setor.
Luis Claudio Megiorin
Contribuinte, Advogado,
pai de alunos, Ex-Presidente da Comissão de Educação da OAB-DF, Ex-Presidente e
Fundador da Associação de Pais de Alunos do DF e Ex-Membro do Conselho de
Educação do DF.
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